segunda-feira, 9 de março de 2009

Tibete convertido em China ao longo de cinco décadas

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Fuga do Dalai Lama, em 1959, marcou o arranque de um processo de aculturação à força


PEDRO OLAVO SIMÕES

Servem os números redondos para lembrar causas, mover protestos, fazer balanços. Há 50 anos, o 14.º Dalai Lama preparava-se para deixar o Tibete, em fuga para um exílio em que permanece e de que dificilmente sairá nesta encarnação.

Pode haver, neste momento, a tentação de querer perceber em que mudou o Tibete, antes um país desconhecido, hoje província da poderosa China. E podem encontrar-se coisas aparentemente boas ou aparentemente más, porque os olhos ocidentais comparam fazendo uso de padrões ocidentais, o que costuma ter maus resultados. O contraponto, saído de observações superficiais, é feito entre um país fechado, pobre e feudal e o que aquilo é agora, injectado à força com progresso "made in China". São os tibetanos mais ou menos felizes?

Só eles - os tibetanos que permanecem no Tibete - saberão. Neste momento, os ocidentais não podem verificar com os próprios olhos, vedado que está o acesso à Região Autónoma de Xizang, assim lhe chamam os chineses. Ora, autonomia é um conceito vago. Enquanto Pequim fala em "ampla autonomia", as organizações defensoras dos direitos humanos denunciam a opressão a que está sujeita a população autóctone, enquanto o Governo no exílio reclama verdadeira autonomia (há muito que o Dalai Lama deixou de reclamar a independência, ciente de que o colosso asiático jamais abdicará de controlar o território e de que a interferência internacional é timorata).

Os dias 9 e 10 de Março são, correntemente, usados para protestos, feitos um pouco por todo o Mundo e apelando à libertação do Tibete. Nesta data, em 1959, um mar de gente impediu Tenzin Gyatso de comparecer a uma convocatória dos chefes militares chineses em Lassa, que quereriam levá-lo para Pequim e forçá-lo a participar na Assembleia Nacional. No dia 17, fugiu para a Índia, acompanhado por milhares de fiéis. Nove anos antes, os chineses tinham entrado no Tibete, porque a descolonização britânica havia quebrado o equilíbrio de influências (os ingleses apoiavam o Dalai Lama, enquanto os chineses suportavam outra facção, identificada com o Panchen Lama, educado na China). O tempo entre a invasão inicial e a fuga do 14.º Dalai Lama foi marcado por um processo sistemático de aculturação levado a cabo pelos chineses, a par de tentativas de erradicação do budismo, matriz identitária dos tibetanos.

Hoje, o Potala, residência do Dalai Lama em Lassa, é património da Humanidade e subsiste enquanto "bibelot" turístico. A cidade tibetana foi transformada em cidade chinesa, onde não falta uma praça ao estilo de Tiananmen, aos pés do palácio, ou avenidas em que as árvores são metálicas, no pior que o "kitch" oriental tem para oferecer. Quase tudo o que é tradicional, no Tibete, é produto turístico, sendo necessário ir às profundezas do território para ver genuinidade.

Esta que é, hoje, a segunda maior região da República Popular da China foi, ao longo dos tempos, cobiçada pelos chineses. Desde a dinastia Manchu, que em 1720 instalou uma guarnição em Lassa, várias vezes o Império do Meio se estendeu para o grande planalto. Para a China comunista não representa riqueza, apenas um baluarte estratégico e um troféu à medida do orgulho imperialista que se mantém. Não é terreno produtivo, é pobre como sempre foi. Antes era um país medievo, coutada de elites religiosas. Mas é assim que corre, com naturalidade, no sangue das pessoas. Chinês à força, é tão natural como as ramagens de chapa em Lassa.

O único rosto universal do povo tibetano

"Parecia-me uma pessoa que durante anos reflectira em solidão sobre vários problemas, e que agora, quando finalmente tinha alguém com quem conversar, queria saber todas as respostas de uma só vez" - as descrições feitas por Heinrich Harrer em "Sete anos no Tibete" (1953), foram o primeiro sinal para o exterior de Tenzin Gyatso, 14.º Dalai Lama, líder do budismo tibetano e chefe do Governo no exílio, prémio Nobel da Paz em 1989. Semi-retirado da luta tibetana, aos 73 anos, aquele que se acredita ser a reencarnação de uma longa linha de mestres passou da reclusão ao estatuto de referência mundial.





http://jn.sapo.pt/PaginaInicial/Mundo/Interior.aspx?content_id=1165296


















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